MISÉRIA ENDÉMICA
A tragédia que agora se abateu sobre o Haiti não vem mais do que trazer à luz do dia a miséria endémica que grassa naquele pequeno país. Num longo texto publicado na revista Courrier de Outubro de 2009 – muito antes do terramoto – “o escritor nicaraguense Sergio Ramirez traça o triste esboço de um país cuja população, atormentada por catástrofes políticas e naturais, acaba por se acostumar à infelicidade.”
Deixamos aqui um pequeno mas significativo excerto desse texto:
(…)“O escritor Lionel Trouillot dir-me-á que, como Maurice, milhares de pais de família investem na educação dos filhos como sendo a única luz ao fundo do túnel da miséria. Seriam capazes de matar por isso. Mas, para as pessoas que vivem com menos de um dólar por dia (60 por cento) torna-se impossível pagar as propinas que o Estado cobra nas escolas públicas, embora se trate de uma quantia simbólica. Mesmo assim, no campo, há crianças que caminham duas horas, sem pequeno-almoço, até à escola. Outros, menos afortunados, acabarão como restaveks (de reste avec, que em francês significa fica com) na capital, entregues como servo a famílias não necessariamente ricas, como nos tempos coloniais, para desempenhar as mais duras tarefas domésticas, sem salário e dormindo no chão.”(…)
Se, muitos dos nossos jovens conhecessem esta realidade, certamente, não se sentiriam, por vezes, tão infelizes por não possuírem farpelas de marca, telemóveis sofisticados ou a última versão de determinados jogos de computador…
Luís Moleiro
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