quinta-feira, 12 de julho de 2012

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (Posição da CGTP)


POSIÇÃO DA CGTP-IN A PROPÓSITO DO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL RELATIVO AO NÃO PAGAMENTO DOS SUBSIDIOS DE FÉRIAS DE NATAL DOS TRABALHADORES DO SECTOR PÚBLICO E PENSIONISTAS


O Acórdão nº 353/2012, do Tribunal Constitucional, que declara a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas da Lei do Orçamento do Estado para 2012, constitui a prova de que o Governo e a maioria parlamentar do PSD-CDS/PP tomaram uma decisão ilícita do ponto de vista constitucional. A declaração de inconstitucionalidade não é dissociável da luta que os trabalhadores desenvolveram contra estas medidas.

Os problemas do País não se resolvem com medidas de austeridade como cortes salariais, aumentos de impostos e restrições de direitos, mas sim com a renegociação da divida, incluindo prazos, montantes e juros, em simultâneo com a adopção de políticas diferentes, que promovam a dinamização do sector produtivo, o crescimento económico, a criação de mais e melhor emprego, o aumento dos salários e das pensões, a justiça social e o desenvolvimento do país.

Por outro lado, e embora reconhecendo que o pedido formulado ao Tribunal Constitucional não invocava esta matéria, é lamentável que o Acórdão não aborde a questão essencial suscitada pelas medidas apreciadas, que é a violação do direito à retribuição do trabalho – direito fundamental dos trabalhadores, que é restringido de forma intolerável e não sustentada nas normas e princípios constitucionais através da redução remuneratória implícita no não pagamento dos subsídios de férias e de Natal.

No entanto, o Acórdão reconhece a desproporcionalidade e o excesso das medidas tomadas pelo Governo dizendo que «(…) nenhuma das imposições de sacrifícios descritas tem equivalente para a generalidade dos outros cidadãos que auferem rendimentos provenientes de outras fontes (..)».

Portanto, de acordo com a doutrina implícita no Acórdão, a medida tomada pelo Governo é inconstitucional porque incide apenas sobre categorias determinadas de cidadãos – os trabalhadores do sector públicos e os pensionistas – e sobre uma única categoria de rendimentos – os rendimentos do trabalho – deixando de fora outros cidadãos e nomeadamente aqueles que auferem rendimentos provenientes de outras fontes que não o trabalho, como sejam rendimentos de capitais e mais valias, incluindo entre outras, as resultantes das transacções bolsistas.

Por outro lado, o Acórdão apenas aflora levemente um aspecto fundamental que é a questão dos limites da definição e invocação do interesse público, agora corporizado na redução do défice orçamental.

Diz o Acórdão que «A referida situação e as necessidades de eficácia das medidas adoptadas para lhe fazer face não podem servir de fundamento para dispensar o legislador da sujeição aos direitos fundamentais e aos princípios estruturantes do Estado de direito (…) A Constituição não pode certamente ficar alheia à realidade económica e financeira (…). Mas ela possui uma específica autonomia normativa que impede que os objetivos económicos e financeiros prevaleçam, sem quaisquer limites, sobre parâmetros como o da igualdade, que a Constituição defende e deve fazer cumprir».

Assim sendo, a legitimidade democrática que assiste ao Governo e à Assembleia da República não confere a estes órgãos poderes ilimitados na definição e prossecução do interesse público, na medida em que a própria Constituição da República impõe limites à sua actuação. Logo, o interesse público não pode ser definido ou invocado de forma arbitrária e ilimitada, devendo a sua prossecução conter-se nos limites do respeito pelos direitos e interesses legítimos dos cidadãos, os quais não podem ser limitados ou restringidos de forma desproporcionada, excessiva ou irrazoável.

Isto significa no fundo que, a pretexto da situação de crise económica e financeira do país, da necessidade de redução do défice e do cumprimento dos acordos com a Troika, o Governo não pode continuar a agir da forma como tem feito até aqui, eliminando, reduzindo e cerceando direitos, sem qualquer respeito pelos princípios fundamentais da nossa Constituição. A Constituição define os limites da acção dos órgãos de soberania e como tal não pode ser ignorada ou suspensa.

Finalmente, a restrição dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade decretada pelo Tribunal neste Acórdão traduz uma profunda contradição nos próprios termos, conforme aliás sublinham alguns votos de vencido, apresentados por juízes conselheiros, nesta matéria.

De facto, não é aceitável que o Tribunal, apesar de considerar na sua declaração de inconstitucionalidade que as circunstâncias excepcionais do país não são suficientes para justificar constitucionalmente a suspensão ou redução dos subsídios de férias e de Natal imposta aos trabalhadores do sector público e aos pensionistas e reformados, vem depois dizer que essa suspensão ou redução se mantém plenamente válida no ano de 2012.

Neste sentido, o argumento não colhe, é falacioso e contraditório e pode mesmo significar que o Tribunal vai além do permitido pelo nº 4 do artigo 282º da Constituição, na medida em que não se limita a impedir a eficácia retroactiva da declaração de inconstitucionalidade, mas vai ao ponto de permitir que se continuem a aplicar as normas declaradas inconstitucionais, impedindo a restituição dos subsídios aos trabalhadores e pensionistas até final do ano.

Em consequência, a CGTP-IN considera que o Governo tem que ser responsabilizado pelas medidas inconstitucionais que tomou e exige a restituição imediata dos subsídios indevidamente retirados aos trabalhadores e aos pensionistas.

A CGTP-IN manifesta, ainda, a sua veemente oposição a quaisquer medidas futuras que visem a eventual generalização do corte de subsídios de férias e de Natal ou de outras remunerações análogas a todos os trabalhadores, dado que, para além de injustas socialmente, são prejudiciais à economia e ao emprego.

A CGTP-IN exorta os trabalhadores e outras camadas da população a lutar contra estas medidas que penalizam os rendimentos do trabalho e deixam praticamente intocáveis os rendimentos de capital, nomeadamente as mais valias, os dividendos e as transacções em bolsa.

6 de Julho de 2012

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