Na comunicação social de massas, cada vez se encontra menos quem recorra a Marx para analisar os fenómenos sociais. Muitos, por carência de formação, não o fazem ou se se metem por esses caminhos só dizem asneiras. Outros, embora com conhecimentos mais que suficientes, evitam determinado vocabulário que a propaganda se encarregou de conotar com ideias e organizações “radicais”. É o caso da “luta de classes”.
Tirando um curto período da história de humanidade – no início – sempre existiram classes sociais, grupos com interesses muitas vezes antagónicos geradores de conflitualidade, ainda que nem sempre violenta. Ou seja, a expressão “luta de classes” deve significar disputa por posições de dominação, sem que isto signifique, na maior parte dos casos, violência pura e simples.
Este curto texto de Daniel Oliveira que transcrevemos do “Expresso” de sábado traz um exemplo simples do que é a luta de classes nos nossos dias.
LUTA DE CLASSES
Enfermeiros e nutricionistas foram contratados, através de uma empresa de prestação de serviços – o Estado dá em lucro a negreiros o que poderia gastar em salários – a receber perto de 4 euros à hora. Bolseiros a trabalhar em laboratórios e universidades do Estado estão, alguns há meses, com as suas bolsas em atraso. Bolseiros de doutoramento e pós-doutoramento receberam este mês atrasado. Uns e outros estão, salvo raríssimas exceções, proibidos de ter outras fontes de rendimento. 250 alunos da Faculdade de Arquitetura de Lisboa com propinas em atraso foram aconselhados pelo presidente daquela instituição a endividarem-se na CGD para continuar a estudar. Não é novo, mas por esse país fora milhares de jovens com formação fazem estágios gratuitos na esperança de entrarem numa profissão qualificada.
Um jovem de uma família com recursos pode, no início da sua carreira, receber 4 euros á hora. Pode ter a sua bolsa em atraso. Pode pagar propinas. Pode trabalhar de graça durante uns tempos. Um jovem de uma família pobre não. Mesmo que seja excelente, terá de desistir e ir fazer outra coisa. Se a seleção social não foi feita na escola, senão tiver sido feita na vida, será feita no início da vida profissional. Qual meritocracia? Tudo está feito para que as castas se perpetuem. A luta de classes pode não se sentir na rua. Mas ela aí está, nesta quase impossível prova de resistência.
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