Para
os mais velhos deste mundo, já terá passado, de certeza, qualquer ideia
parecida com o primeiro parágrafo do artigo de opinião seguinte, que
transcrevemos do Público de hoje.
Na
realidade, ainda há poucas décadas, muita esquerda englobava a social-democracia
na direita. A radicalização ideológica trazida pelo extremismo neoliberal,
atirou a verdadeira social-democracia para o extremo oposto. Os keynesianos ganharam
agora o título de perigosos radicais de esquerda, por parte da propaganda
neoliberal. Até a doutrina social da igreja, base ideológica para a criação do
CDS é agora considerada de esquerda…
Pela
forma simples e clara com que desmonta a situação actual, o seguinte texto, da
autoria de um economista doutorado em economia da felicidade (*), merece uma
leitura atenta.
De
tal forma mudou o mundo, que é caso para se dizer que, hoje, até os
sociais-democratas (pelo menos os verdadeiros) comem criancinhas ao
pequeno-almoço.
Num
recente texto, Pacheco Pereira ilustrou bem este paradoxo contemporâneo ao
enunciar diversos princípios fundadores do PPD de Francisco Sá Carneiro, que
hoje são considerados perigosamente extremados, quer pelas gentes do PSD e do
CDS, quer mesmo por algumas facções do PS.
Se
no PREC se podia dizer que tudo estava guinado à esquerda (em que Mário Soares
era considerado um perigoso fascista, aliado da CIA e dos Americanos), hoje
deu-se uma volta de 180 graus, em que tudo o que se afasta da cartilha
neoliberal do consenso do Washington, do Clube de Bilderberg ou da Mont Pelerin
Society é considerado um perigoso extremismo de esquerda.
Por
isso, Pacheco Pereira ou Diogo Freitas do Amaral são vistos como loucos
anacrónicos, que guinaram para a esquerda, quando tudo o que fizeram foi,
apenas, terem-se mantido fiéis aos seus ideais (a social-democracia em Pacheco
Pereira, a doutrina social da Igreja, em Freitas do Amaral).
A
verdade é que a lógica do mundo mudou desde os anos 60/70. O bloco de Leste
ruiu (tirando argumentos a alguma esquerda) e os “senhores do mundo”, com a sua
eficiência habitual (no tomada do poder), foram percebendo o que tinham que
fazer para contornar a democracia.
Na
Europa, este fenómeno foi global, com os diversos partidos socialistas a
seguirem as ordens dos “donos do mundo”, criando a “terceira via” que mais não
é do que a via neoliberal com cosmética social, de que Tony Balir foi um dos
maiores protagonistas.
Supranacionalmente,
é culpa da Organização Mundial do Comércio esta globalização selvagem que nos
governa e é culpa da desregulamentação financeira esta financeirização perversa
que nos oprime. E tudo isso alimenta a pobreza e as guerras que grassam no
mundo, da qual brotam os refugiados e a emigração desesperada.
Está
de tal maneria o mundo que mesmo os bastiões da boa social-democracia (os
países nórdicos) se vêem forçados a ir mudando de rumo, tal é a força desta
nova ordem mundial.
Porém,
com a crise financeira de 2008 (e as sucessivas ondas de choque) mais as
constantes instabilidades da economia mundial, começa a ficar claro que a via
neoliberal conduzirá o mundo a uma inevitável catástrofe financeira e militar.
A
única saída para um problema global como este é uma resposta popular global. Se
antes se pedia às classes operárias de todo o mundo que se unissem na conquista
dos seus direitos, hoje temos que apelar à consciência colectiva das classes
médias de todo o mundo para que não permitam que lhes destruam a vida.
Precisamos
de força colectiva para regular a globalização (e impedir o dumping social),
controlar os mercados financeiros (e impedir a especulação sem fim) e estancar
a evasão fiscal em massa (acabando com os paraísos fiscais e a lavagem de
dinheiro debaixo dos nossos narizes).
Não
precisamos de destruir o capitalismo ou a economia de mercado, precisamos,
apenas, de voltar a pô-los sob o jugo democrático dos povos.
“Classes
médias de todo o mundo, uni-vos!”, terá, então, que ser o lema deste novo
milénio. Essa será a única forma de deixarmos de viver num mundo cada vez mais
instável e perigoso, num mundo ao contrário, em que a infelicidade é o único
destino.
(*) Gabriel
Leite Mota
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