Guerra aberta entre governo e poder judicial
Que fazer com umas escutas que parecem queimar quem pega nelas? O Supremo Tribunal resolveu queimá-las de vez. Uma vez mais o Engenheiro vê-se livre da justiça, mas uma vez mais fica uma nódoa de suspeita que, sem poderem ser ouvidas as gravações, nunca desaparecerá e o perseguirá para sempre. O que fica são os ruídos das fugas ao segredo de justiça publicadas nos jornais, verdadeiras ou não. Fica também duvida se é só incapacidade do Ministério Publico de travar essas fugas ou se já faz parte da sua normal forma de actuar. By KaOs
José Sócrates começou por apoiar a investigação do Face Oculta, mas rapidamente passou para a posição de ataque, acusando a mesma investigação de o ter escutado ilegalmente. "O ponto, e importa não confundir as coisas, é saber se durante meses a fio eu fui escutado - porque isto está a passar todas as marcas, se essas escutas foram legais e se é possível fazê-las num Estado de Direito." E espera agora que o Procurador-Geral da República, Pinto Monteiro, se apresse a esclarecê-lo. Mais uma vez, reforçou que, para ele, é a questão de todo este processo. "Desconheço as escutas, não estou a par de nada e sei apenas o que vem nos jornais. Espero que o senhor procurador, com o esclarecimento que prometeu, possa esclarecer-nos a todos. A questão mais importante para mim é saber se, durante meses a fio, fui escutado, com as conversas a serem transcritas e gravadas, e se isso é legal e possível num Estado de Direito." Porque, acrescenta, "são conversas privadas".
Contudo, após o semanário "Sol" ter avançado com a notícia de que Sócrates terá mentido em Março no Parlamento sobre a venda da TVI à PT, esta não é a questão essencial para os partidos da oposição - não estão dispostos a largar o chefe do executivo e querem que explique exactamente o que sabia do negócio.
A justificação do primeiro-ministro é em dois actos. Admitiu ter tido "um conhecimento informal" sobre o assunto e até ter falado com amigos. Essa é, no entanto, a resposta de Sócrates cidadão, que difere da resposta de Sócrates primeiro-ministro. "Uma coisa é naturalmente discutirmos com amigos, como fiz, notícias que são publicadas nos jornais e conhecimentos informais. Outra coisa é, como disse no Parlamento, o conhecimento oficial e o conhecimento prévio desse negócio", disse. Sobre a notícia do "Sol" que adianta ser este um dos temas das conversas gravadas com Vara - e das quais o Ministério Público retirou certidões, que foram entretanto consideradas nulas pelo Supremo Tribunal de Justiça - Sócrates corrige. "Não é uma notícia, é um insulto."
O ex-bastonário dos Advogados, Pires de Lima, fala em "descalabro do Estado de Direito" e acusa Sócrates de "não estar interessado em esclarecer, mas em vitimizar-se", referindo que "sempre pôs em causa a idoneidade da PJ em tudo quanto lhe diz respeito a ele". Já o juiz desembargador Rui Rangel acredita que "fica mal a um primeiro-ministro questionar a justiça e é preocupante que o faça". Defende ainda que "o Presidente da República já devia ter-se pronunciado".
O ministro Vieira da Silva foi ainda mais longe que Sócrates. "O que motiva essas forças e as pessoas que estão por trás do que me parece ser uma ilegalidade não é qualquer averiguação relativamente a qualquer processo de corrupção. É pura espionagem política, porque estar a ouvir um dirigente de um partido que também é primeiro-ministro sobre temas políticos e depois colocá-los nos jornais, através de escutas cuja legalidade é mais do que duvidosa, considero isso algo de extremamente preocupante."
"Deplorável", "inaceitável" para um governante e "uma efectiva pressão relativamente ao Ministério Público" é como o comunista António Filipe recebe estas afirmações. Ana Drago, do Bloco de Esquerda, diz que tudo isto é insustentável e exige "decisões e esclarecimentos rápidos". O deputado do PSD Fernando Negrão exige que o ministro da Economia se retrate, enquanto Diogo Feio, do CDS, diz que o partido "tem há meses" a convicção de que Sócrates queria mexer na TVI. Com Sandra Pereira
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