É
um dado adquirido que os números, quando torturados, dizem aquilo que nós
queremos. Foi o que aconteceu com um estudo do FMI divulgado há pouco tempo,
segundo o qual os mais ricos teriam sido mais penalizados do que os pobres com
a actual política de austeridade. No entanto, uma análise séria e independente
revela aquilo que o senso comum dita: são as classes média e de mais baixos
rendimentos que estão “a suportar a maior parte do fardo da austeridade”.
Obviamente
que as conclusões do estudo do FMI carecem de “falta de credibilidade” e visam enganar
a opinião pública para que ela aceite com mais facilidade as políticas que
estão a ser levadas a cabo. É isso que o economista Eugénio Rosa demonstra no
texto seguinte, utilizando para tal dados oficiais.
Segundo
o estudo do Institute for Social and
Economic Research da Univresity of Essex da Inglaterra, com o título “The
distributional effects of austerity mesures: a comparison of six EU countries”,
no nosso país, a política de austeridade determinou uma redução de 6% no
rendimento disponível dos mais pobres e apenas uma diminuição de 3% no
rendimento dos mais ricos. E isto foi até 2011, e as políticas mais violentas e
injustas de austeridade tiveram lugar a partir daquele ano.
Mas
uma análise concreta da natureza das principais medidas impostas ao país pela “troika”
e pelo governo PSD/CDS mostra também a falta de credibilidade das conclusões do
estudo do FMI, que visa no fundo manipular a opinião pública para tornar esta
política mais aceitável por ela. É o que se vai procurar fazer utilizando, para
isso, a linguagem fria dos números oficiais.
Os
dados constantes dos relatórios que acompanham os Orçamentos de Estado de 2011,
2012, 2013 e 2014, mostram os cortes significativos feitos na despesa pública,
assim como o aumento brutal dos impostos no período da “troika”, ficando também
claro que classes de populações foram atingidas por essas medidas.
Dos
15434 milhões de euros de cortes
feitos na despesa pública no período 2011-2014, 71,2% dizem respeito a cortes
feitos em despesas com prestações sociais (nomeadamente pensões), nas
remunerações, e em despesas com a educação e saúde, portanto que afectam
fundamentalmente classes de médio e baixo rendimento. Por outro lado, do
aumento de impostos no montante de 9920
milhões de euros verificado também neste período, 75,4% resultam de subidas
feitas no IVA, no IRS e nos descontos para a ADSE, SAD e ADM, portanto impostos
que afectam principalmente as mesmas classes sociais. É evidente que quem está
a suportar a maior parte do fardo da austeridade são as classes média e de
baixos rendimentos, e não os ricos como afirma o FMI no seu estudo. Interessa ainda
referir que os cortes na despesa pública e o aumento de impostos já somam 25354 milhões de euros (15,1% do PIB) e a redução
do défice foi apenas de 9740 milhões
de euros (5,8% do PIB), ou seja, 2,6 vezes menos. É um preço demasiado elevado
que o país e os portugueses estão a pagar.
Um
exemplo paradigmático desta política de austeridade foi o aumento brutal do
IRS. E isso foi feito de duas maneiras. Em primeiro lugar através da redução significativa
dos benefícios fiscais a nível de IRS em que se tratou da mesma maneira quem
tinha baixos rendimentos e rendimentos elevados. São exemplos de tal política a
redução de 30% para apenas 10% das despesas de saúde que podem ser deduzidas no
IRS igual para todos o que determinou que só por esta razão, o IRS pago tenha
aumentado em 327 milhões de euros; outra medida com efeitos semelhantes foi a dedução
para metade da despesa com o crédito para habitação que poderá ser deduzida no
IRS o que provocou um aumento de IRS estimado em 412 milhões de euros por ano; situação
também semelhante se verificou em relação às despesas com a educação dos filhos
o que determinou também uma subida do IRS pago pelas famílias (mais 154M€) (*).
(*) Diário as beiras
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