É
monstruosa a manobra de propaganda levada a cabo pelo Governo para justificar o
injustificável relativamente a mais um chumbo do Tribunal Constitucional (TC). Não
estamos perante uma situação de incompetência dos nossos governantes mas numa
simples acção de terrorismo político, de consequências imprevisíveis.
Percebe-se que esta gente quer transformar a democracia portuguesa num arremedo
em que as decisões determinantes para a vida do país são tomadas por entidades
não submetidas ao sufrágio. De quatro em quatro anos convocam-se os eleitores,
cujo voto não tem qualquer espécie de influência para além de mudar uma ou
outra cara nos executantes das políticas decididas muito longe de nós.
O
cumprimento de leis é uma coisa que Passos e Portas, como bons intérpretes do
neoliberalismo mais radical, acham anacrónica uma vez que o verdadeiro poder é
uma emanação dos mercados e do capital financeiro. Quem tem poder para fazer
cumprir a lei vai enfrentar uma guerra sem quartel.
A
opinião pública está a ser submetida a uma avalanche de propaganda governamental
cuja principal finalidade é confundir os portugueses. Que fique bem claro que o
Governo defende interesses alheios, sem qualquer correspondência com os da
esmagadora maioria dos cidadãos nacionais.
Às
mentiras emanadas pelo poder tem de ser dada uma resposta adequada e essa
resposta é a simples reposição da verdade. O texto (*) seguinte que
transcrevemos do Público de hoje insere-se exactamente nessa estratégia embora
tenhamos consciência de que, ao contrário do que possa parecer, é muito difícil
fazer chegar a verdade às pessoas.
Marco
António Costa é um estadista! Porque integrou um Governo de estadistas. Porque
é dirigente nacional do partido que governa o país. Nessa qualidade, decretou,
há dias, que o Tribunal Constitucional (TC) “insiste” em “arrastar o país para
o passado”. No contexto, também decretou que o seu Governo arrasta o país para
o futuro.
O
Governo responsabiliza sempre os outros pela sua incapacidade e incompetência.
Não se ficou pelo TC. Acrescentou que “tantas instituições contribuem para a
instabilidade do país”. Está tudo contra o Governo! Que extraia daí as
consequências.
O
Governo puxa o país para a frente. Para mais perto do precipício. Do abismo.
País
onde estacionam centenas de milhares de desempregados e emigrantes sobretudo
jovens; milhões de pessoas no limiar da pobreza; onde a reforma do Estado se
traduz em cortes nos salários e reformas; onde se torram milhões, sempre mais
milhões em bancos falidos, swaps, parcerias público-privadas,
rendas e por aí fora.
Este
é o futuro que o poder oferece.
Marco
António Costa e o seu Governo podem continuar a pregação da demagogia e
“sucesso” da saída da troika. Ela cá continua com hotel
reservado.
O
povo português mostrou-lhes a sua revolta e descontentamento. Atribui-lhes os
restos de 27% num acto eleitoral eloquente. Não faz a distinção grosseira do
poder: as pessoas não estão bem, mas o Estado está melhor.
Eles
são o Estado. O povo está de fora.
O
TC haveria de conformar a Constituição da República ao memorando da troika,
que se travestia de Constituição, código e lei. Tudo interpretado com as regras
de Excel da troika.
A
Constituição e seus princípios deveriam submeter-se a esta, ao Governo que lhe
obedece, ao memorando. O país seria uma colónia, com leis vindas do
estrangeiro.
Acham
ou dissimulam que o TC está aí para talhar o fato à medida dos orçamentos do
Governo. Recusam a natureza do TC, órgão de soberania com competências
próprias. Detentores da verdade, nunca aceitam que, em democracia, o poder de
Estado se reparte por várias entidades.
Ao
Tribunal Constitucional cabe defender a dignidade da instituição. Decidir com
independência e imparcialidade as questões que lhe são submetidas. Os juízes
desse tribunal não são amanuenses ou assessores do Governo.
Este,
na execução dos seus projectos, deve cumprir a lei. Como jurou! Não como é
inspirado pelas centenas de assessores ignorantes dos ministérios ou pela
volúpia das sociedades de advogados pagas a preços de ouro.
Com
uma chusma de advogados e assessores, o Governo foi impotente e incapaz de
perceber a decisão do TC. Patético, pediu instruções! Ao que o país chegou!
Governantes que não sabem interpretar uma decisão judicial. Litigante
relapso, quer é atrasar o cumprimento da sentença.
A
questão não está no Tribunal Constitucional. Está no Governo. Sem imaginação,
nem capacidade, nem competência para governar o país de acordo à Constituição.
Não
tem política. Limita-se a impostos e mais impostos. E cortes.
Fala
do “buraco” de 600 milhões criado pelo TC. O “buraco” foi o Governo que o
cavou, parindo leis inconstitucionais.
O
Tribunal Constitucional, nos termos constitucionais, concedeu-lhe um
“abatimento” de outro tanto.
(*) Ex-procurador-geral distrital do
Porto
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