Dificilmente poderemos encontrar no mesmo
jornal e no mesmo dia duas pessoas com posições ideológicas opostas a
convergirem no mesmo ponto sobre uma tomada de posição eminentemente política
em que o actual Governo insiste – espoliar reformados e funcionários públicos
das remunerações a que têm direito. Esta convergência de opiniões é o primeiro
sinal da brutal injustiça que está a ser cometida sobre os trabalhadores da
função pública e sobre aqueles que tendo trabalhado uma vida inteira vêem agora
rasgado um contrato que fizeram com o Estado segundo o qual estaria garantida uma
subsistência digna na velhice.
As opiniões seguintes que foram
transcritas do Correio da Manhã de ontem são de Joana Amaral Dias, assumida
militante de esquerda e de João Pereira Coutinho que também não esconde a sua
simpatia pela direita.
A contribuição
extraordinária de solidariedade devia chamar-se penhora com escárnio
Contribuição extraordinária de
solidariedade (CES). O nome é todo um programa. Primeiro: não se trata de uma
contribuição mas de um imposto. Rigorosamente, de um confisco. Segundo, de
extraordinário nada resta, porque a exceção já virou regra. Por fim, se
implodir os direitos adquiridos ao longo de uma vida inteira de trabalho é
solidariedade, sal é açúcar.
Este governo nutre um profundo desdém
pelos nossos velhos, pontuando negativo naquilo que mais revela o caráter de
uma sociedade: como se tratam os avós. CES é despudorada propaganda, aquela que
designa a coisa pelo seu contrário – do tipo nomear cortes de recalibragem,
espoliação de "alargamento da base de incidência", que fez Portas
falar do irrevogável e o PR dos limites para os sacrifícios (quando, na
verdade, já tinha dito que só restava esperar que os funcionários públicos
morressem).
Portanto, a contribuição extraordinária de
solidariedade devia chamar-se penhora permanente com escárnio. Afinal, o que o
governo quer dizer é: "Definhem para aí, gentalha inútil." E será
esse o consenso que pretende Cavaco?
Joana Amaral Dias
Reformados e
funcionários públicos são pau para toda a obra.
Depois do chumbo do Constitucional à
convergência das pensões, e sabendo-se que uma reforma do sistema não se faz da
noite para o dia, havia duas hipóteses: negociar com a ‘troika’ uma benevolência
residual no défice para 2014; ou ir directamente ao bolso de reformados e
funcionários públicos, que neste país são pau para toda a obra.
Sem surpresas, o governo optou pela
segunda via, com o alargamento da contribuição extraordinária de solidariedade
e o aumento de contribuições para a ADSE. A escolha é uma confissão de
desespero. Mas é também de incompetência, sobretudo quando Marques Guedes
garante, sem se rir, que a reforma ‘duradoura’ e ‘abrangente’ nos regimes da
segurança social virá no fim da festa. Boa noite e boa sorte.
Eu fico-me pelos factos: o governo termina
o ‘ajustamento’ exactamente como o começou. A espremer reformados e
funcionários públicos. O resto é conversa.
João Pereira Coutinho
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