quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

ECOS DE UM RELATÓRIO ALARMANTE


O relatório da ONG Oxfam sobre a desigualdade no mundo propositadamente publicado por ocasião da realização do Fórum Económico Mundial (FEM) de Davos é esmagador em relação ao que actualmente se passa no planeta, no que diz respeito ao acentuar do fosso que separa ricos e pobres. Em vez de as desigualdades diminuírem, estão, pelo contrário, a acentuar-se até em países tidos como mais igualitários. Fazendo uma conta simples, o prof. universitário Viriato Soromenho Marques chama-nos a atenção para um dado tristemente curioso: “em 2014, um super-rico custa a miséria de 41.176.000 infelizes.” Parece humor negro mas é a realidade pura e dura a que nos conduziu a aplicação do radicalismo neoliberal em todo o mundo.
A injustiça na distribuição da riqueza está a tornar-se tão gritante que, felizmente, tem provocado algumas reacções na opinião publicada. Encontrámos no Público de hoje um artigo de opinião, cujo autor (Miguel Pimentel) não pode ser considerado um radical depois de várias afirmações que vai produzindo ao longo do texto mas que não se coíbe de chamar a atenção para as crescentes desigualdades sociais em todo o mundo, com o inevitável cortejo de rupturas violentas que produzirá. Dada a extensão do texto, deixamos aqui os excertos que considerámos mais significativos.
As questões sobre a desigualdade na distribuição da riqueza no mundo são conhecidas mas a frieza dos números dá-nos uma perspectiva mais real e dramática deste tema: as 85 pessoas mais ricas acumulam a mesma riqueza que as 3.570 milhões mais pobres, 46% da riqueza do mundo é detida por 1% das famílias mais ricas, 7 em cada 10 pessoas vivem em países onde a desigualdade na distribuição da riqueza se tem agravado nos últimos 30 anos, 1% da população mundial detém 110 biliões de dólares de riqueza (estou a falar na convenção tradicional, são 110 milhões de milhões) que corresponde a 65 vezes a riqueza detida pela metade da população mais pobre, a percentagem de riqueza detida por 1% da população mais rica em relação à restante população tem aumentado em 24 de cada 26 países entre 1980 e 2012, nos Estados Unidos 95% da riqueza gerada com o crescimento pós-crise, desde 2009, foi captada por 1% da população enquanto que 90% da população ficou mais pobre, uma em cada 3 pessoas vive na pobreza.
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Em Novembro de 2013 o Fórum publicou o resultado de um inquérito num relatório com as Perspectivas da Agenda Mundial para 2014 em que classificava as desigualdades da distribuição da riqueza como o segundo maior risco mundial para os seguintes 12 a 18 meses. De acordo com a interpretação dos resultados deste inquérito, a desigualdade na distribuição de rendimentos tem implicações directas na estabilidade social de cada país e é uma ameaça à segurança a uma escala global.
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A desigualdade extrema na distribuição de riqueza é um problema por variadas razões. Em primeiro lugar é moralmente questionável mas, mais importante, tem um impacto negativo tanto no crescimento da economia como na redução da pobreza assim como cria diversos problemas sociais. Para além destas consequências directas ainda é potenciador de outras desigualdades, nomeadamente pelo efeito pernicioso que a concentração de riqueza possa provocar na representação política. Sei que este é um discurso típico da extrema-esquerda mas ninguém tem dúvidas das mil e uma maneiras que o poder económico utiliza na condução política, conseguindo paulatinamente que a produção legislativa não só seja feita em beneficio dos mais ricos como, ainda mais grave, seja muitas das vezes produzida à custa dos mais pobres. As consequências são evidentes, trata-se do enfraquecimento do princípio democrático, da destruição da coesão social e do desaparecimento da igualdade de oportunidades, tudo isto princípios fundamentais para que uma sociedade funcione normalmente.
O percurso parece evidente, ou existe coragem e autonomia política para travar a influência que os mais ricos têm na produção legislativa ou os governos “continuarão” a trabalhar no seu interesse, aumentando cada vez mais as desigualdades. Este fenómeno foi resumido pelo jurista americano Louis Dembitz Brandeis há quase 100 anos: “Podemos ter democracia ou podemos ter uma concentração da riqueza nas mãos de poucos, não podemos é ter as duas coisas”. Tenho muito receio que a solução de um problema desta dimensão passe pela actuação dos governantes nos diferentes países mas felizmente e paradoxalmente são hoje também os mais ricos que precisam de reverter esta tendência. Não o fazer no curto prazo terá consequências irreversíveis, dando lugar a um monopólio de oportunidades, em que as taxas de imposto mais baixas, a melhor educação e sistema de saúde estarão disponíveis apenas aos filhos dos mais ricos, uma dinâmica que se tornaria um ciclo vicioso de vantagens transmitidas de geração em geração e que acabaria inevitavelmente numa ruptura social que a ninguém interessaria.
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