Muitos ainda recordarão a promessa do
então candidato “socialista” Francois Hollande, nas últimas eleições
presidenciais francesas, de taxar fortemente as grandes fortunas.
Recentemente foi feito um grande alarido
à volta de um imposto de 75% que os muito ricos iriam pagar em França. Este
valor foi usado pela propaganda da direita francesa para criticar fortemente o governo
e para este exibir um enorme foguetório reclamando uma medida de justiça fiscal
quando, tudo espremido, se conclui que os
verdadeiramente “muito ricos” continuam a escapar-se por entre as malhas da
rede. Em toda a França, a nova taxa supostamente de justiça fiscal vai
abranger um escasso milhar de pessoas, dando um ar de esquerda ao PS gaulês e
ludibriando, de caminho a esmagadora maioria do povo. Lá como cá, com “socialistas”
deste calibre não se chega a lado nenhum em termos de uma mais justa distribuição
da riqueza.
A história da criação do imposto sobre os
franceses muito ricos é contada, com laivos de ironia, por José Vítor Malheiros,
numa parte do texto que assina no Público de hoje.
O Presidente
francês François Hollande conseguiu há dias ver finalmente aprovada, depois do
chumbo pelo Conselho Constitucional de uma primeira versão da lei, uma das
medidas emblemáticas da sua campanha eleitoral: um imposto de 75% a ser pago pelos
ricos. Bom, não exactamente de “75%”, mas sim de 75% sobre a parte do salário
que exceda um milhão de euros por ano, o que é um pouco diferente. Bom, e o
imposto não é exactamente de 75%, mas sim de cerca de 50%, só que a “carga
fiscal” chega a 75% se se somarem também as contribuições para a Segurança
Social. Bom, e o imposto não é exactamente um imposto que vise uma mais justa
distribuição da carga fiscal mas uma medida provisória que deverá vigorar
durante dois anos e que, por isso, se chama “contribuição excepcional de
solidariedade”. Bom, e o imposto também não é exactamente sobre os mais ricos
porque ele incide apenas sobre rendimentos do trabalho e não sobre rendimentos
do capital e os verdadeiramente ricos, como sabemos, não vivem do seu salário.
Ah, e as empresas podem assumir à sua conta o pagamento do novo imposto se
preferirem não o fazer incidir sobre os salários dos trabalhadores – o que deve
acontecer em muitos casos já que, nestas empresas, as decisões cabem
precisamente aos assalariados com os salários mais altos, o que significa que
estes contribuintes terão o privilégio de alienar as suas perdas fiscais se o
quiserem fazer e de as “socializarem” em parte fazendo-as pagar pelas suas
empresas (accionistas, clientes, outros trabalhadores). Mas nada disto impediu
Hollande e o Governo e os socialistas franceses de venderem o imposto como uma
medida de justiça fiscal, a direita de a criticar como um confisco inaceitável
e o mundo dos negócios de criticar o “socialismo” da medida por atentar contra
a saúde financeira das empresas e contra a competitividade da França.
Há
em tudo isto algum descaramento. Descaramento do Governo francês, antes de
mais, por apresentar este imposto, que afectará uns escassos mil cidadãos, como
uma medida central do seu programa de justiça fiscal e um resgate da riqueza
injustamente acumulada pelos “mais ricos” enquanto os verdadeiramente “muito
ricos” continuam a escapar-se por entre as malhas da rede. Também por cá Passos
Coelho considera que os “ricos” são os pensionistas que ganham 600 euros e os
assalariados que ganham 1500.
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