No
texto que reproduzimos a seguir, o Presidente da Secção Regional do Centro da Ordem
dos Médicos (*) afirma na parte final que “a realidade da saúde um Portugal é
muito diferente da realidade mediática criada pelo Ministério [da Saúde]”. Afinal,
nada que não aconteça em todas as áreas da governação onde, quem não se deixa
levar por cantos de sereia sabe bem que a realidade portuguesa não tem nada a
ver com aquela que os nossos governantes pintam na comunicação social especialmente
na televisão. A “cultura de verdade e responsabilidade” de quem gere os
destinos do país nunca esteve tão ausente como agora. Vale tudo para manter o
poder, até o mais despudorado encobrimento da verdade.
A
Ordem dos Médicos não é propriamente uma organização radical e, por isso, vale
a pena ler-se o que afirma um dos seus responsáveis sobre “a realidade da saúde
em Portugal”.
1233236 portugueses sem médico de família.
1
em cada 12 portugueses não tem médico de família atribuído.
Insensibilidade
pelos problemas, pelas dificuldades económicas e sociais dos doentes.
Desinvestimento
nos cuidados de saúde primários.
Desorganização
na distribuição geográfica dos recursos humanos.
Falta
de médicos, de enfermeiros, de administrativos e de auxiliares.
Desarticulação
na ligação entre os Cuidados de Saúde Primários e os hospitais.
Hiperburocratização
dos cuidados de saúde.
Disfunção
dos programas informáticos criados pelo Ministério da Saúde, falta de interligação
entre eles e desadequação aos computadores, material informático obsoleto.
Desconhecimento
das realidades das unidades de saúde pelos dirigentes da Saúde.
Criação
de profundas desigualdades entre as unidades de saúde, mesmo quando muitas
vezes coabitam no mesmo Centro de Saúde.
Instalações
exíguas e sem qualquer manutenção.
Gabinetes
médicos sem espaço para entrarem macas ou cadeiras de rodas ou os familiares
dos doentes.
Instalações
mais compatíveis com países do Terceiro Mundo do que com um país moderno.
Gabinetes
onde chove sobre a secretária do médico.
Funcionários
a trabalharem em despensas no meio de dossiers.
Paredes
enegrecidas pela humidade devido às permanentes infiltrações.
Tetos
e paredes a cair, chão degradado.
Funcionários
que compram aquecedores e equipamentos de ar condicionado que nunca foram
colocados.
Profissionais
de saúde a comprarem papel, luvas, otoscópios, pilhas, etc.
Médicos
que têm de trazer, das suas casas, cadeiras que faltam para si e para os
utentes.
Médicos
em formação a partilharem o mesmo gabinete.
Falta
de equipamentos adequados para tratar os doentes.
Faltas
de medicamentos como analgésicos, insulina, aerossóis, etc, etc, etc.
Criação
de barreiras que prejudicam a relação médico-doente.
Desumanização
da saúde.
Estas
são algumas das realidades que a Ordem dos Médicos tem detetado nas unidades de
saúde primárias. Este balanço é conhecido dos profissionais de saúde e dos
utentes. É uma realidade muito diferente da que é transmitida pelo Ministério
da Saúde. É um quotidiano que é, afinal, um dos seus maiores falhanços.
O
colapso não é total devido à coragem, dedicação e empenho dos médicos, dos
enfermeiros, dos administrativos e dos auxiliares que lutam – diariamente –
contra as adversidades e dificuldades perpetradas por uma organização e gestão
incompetente dos responsáveis do setor.
O
Dia Mundial do Médico de Família – que devia servir para o poder político
homenagear o papel importante que estes médicos desempenham na saúde em Portugal
e na humanização de todo o setor – serviu, porém, para mais uma infeliz
oportunidade de apresentar mais promessas de contratação futura de médicos, de
abertura de novas unidades de Saúde Familiares, de investimentos nas Unidades
de Cuidados de Saúde Personalizados, de médicos de família para todos os
portugueses e de desenvolvimento de cuidados de saúde primários, nomeadamente
na sua ligação aos hospitais.
A
realidade da Saúde em Portugal é muto diferente da realidade mediática criada
pelo Ministério. Falta uma cultura de verdade e de responsabilidade aos seus
responsáveis.
É
difícil existir uma área onde a diferença entre o prometido e o realizado é tão
evidente.
(*) Carlos
Cortes, Diário de Coimbra
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