Ainda
não passaram três anos desde que foram impedidas tentativas de projectos que
levariam, na prática, à destruição da qualidade ambiental e paisagística da ria
de Alvor e já se perfila novo ataque àquela zona protegida, uma verdadeira
pérola do barlavento algarvio. Nada fazia acreditar que tal atrevimento fosse
possível, depois de decisões judiciais tão fortes e tão recentes mas o que
agora está a passar-se deve servir de alerta para todos os habitantes da região
em particular e do país em geral.
Para
além das movimentações que estão a ter lugar localmente, é sintomático que mais
este ataque à zona protegida da ria de Alvor comece a ecoar mais longe como se
verifica pela tomada de posição de Luísa Schmit, doutorada em Sociologia do
Ambiente, em artigo de opinião no Expresso de ontem – 28 de Fevereiro.
Outra
vez no Algarve, outra vez no litoral, outra vez numa zona protegidíssima, outra
vez mais do mesmo: um projeto imobiliário onde nem pensar nisso devia ser
possível. Mas em Portugal acaba sempre por se encontrar a via para mais uma
exceção e, depois, uma mão lava a outra.
O
caso passa-se na ria de Alvor, especificamente na quinta da Rocha, onde se
apresenta agora uma proposta para um Núcleo de Desenvolvimento Turístico, ou
seja, um grande empreendimento (dois hotéis, dois aldeamentos e a parafernália
que acarretam). Isto, depois de já terem sido impedidas outras tentativas de
projetos; depois de uma condenação do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé
em 2012 (confirmada pelo Tribunal Central Administrativo do Sul) pela destruição
ilegal de valores naturais, obrigando à respetiva reposição; depois dos mais
que reconhecidos constrangimentos físicos e legais de qualquer zona costeira;
depois do reconhecimento internacional da ria de Alvor, classificada como Sítio
de Importância Comunitária e Sítio Ramsar (ao abrigo da respetiva Convenção),
além de ser um estuário riquíssimo que funciona como uma autêntica “maternidade”
para a vida aquática e marinha e, muito sensível e frágil.
Depois
de tanto reconhecimento oficial, leis e decisões judiciais, pensávamos que podíamos
estar descansados, pois nenhuma imobiliária iria espetar a sua urbanização naquele
magnífico lugar.
Mas
não. Para surpresa e alarme constante – não vá o país perder o hábito de ter
medo –, uma mão invisível (fundo imobiliário?) acaba de voltar a assomar a
Administração com mais um projeto megalómano.
Os
contornos da novela são, aliás, fantásticos e passam ainda por vendas a
empresas registadas em zonas francas, pelo BPN, pelas dívidas de milhões, pelos
então habituais empréstimos sem garantia bancária baseados em especulação que,
por sua vez, passaria pela “viabilizaçãozinha” permitindo o salto mortal
financeiro – aquele que durante anos se fez e que tanto ajudou a afundar o
país, e que agora convinha muito às contas de algumas pessoas e aos bancos.
O
custo de tudo isto? Para eles uma ninharia: rebentar com a ria de Alvore com
aquelas coisas vagas que alguns tanto desvalorizam, como sejam o respeito pelo
bem comum, pelo cidadão, pelo Estado e pela insubstituível Maravilha daquele
lugar e sua função vital.
E
por falar em Estado, como pode a Administração estar ao mesmo tempo a demolir –
e muito bem – casas e casotas nas ilhas barreira da ria Formosa para corrigir
alguns dos graves erros de ocupação do passado nessa área natural excecional e,
no mesmo Algarve, continuar a deixar-se construir empreendimentos em zonas
vulneráveis, destruindo aquilo que atualmente mais valoriza o turismo: a
qualidade ambiental e paisagística?
Felizmente,
neste caso, como nalguns outros, organizaram-se grupos de cidadãos (incluindo
estrangeiros residentes), que se mexem, denunciam e lutam contra a destruição do
nosso país. Foi assim na Lagoa dos Salgados/Praia Grande, nas falésias da Pedra
do Ouro em Alcobaça, e agora na ria de Alvor, através de várias associações com
destaque para A Rocha – Associação Cristã de Estudo e Defesa do Ambiente. E está
a ser assim também com os clubes de surfistas um pouco por todo o país.
O projeto esteve em consulta
pública até ao passado dia 20 deste mês [Fevereiro]. Mas todo o cuidado é pouco
nesta fase. Com a chegada de novos fundos comunitários (2014-2020) e nas
vésperas da mudança de um governo para outro, maior é o perigo das velhas
negociatas do costume, cozinhando projetos PIN à pressa para caírem no colo dos
governantes que entram.
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